AMIGO
A CANTINA DO
CHALETA ERA UMA CASA CANSADA NA IDADE,
CHEIA DE RUGAS
E PAREDES PINTADAS DE AZUL E VERDE GARRIDOS.
A CANTINA DO
CHALETA ERA O PEDAÇO DO MUNDO
ONDE LIMPÁVAMOS
O PÓ DAS PICADAS
E AFOGÁVAMOS AS
SAUDADES QUE NOS ATROFIAVAM OS SONHOS...
E VI-TE.
ESTAVAS LÁ PERDIDO EM MEMORIAS MALÉFICAS,
DISFORMES,
DAQUELAS MEMORIAS QUE NOS ENVELHECEM EM SEGUNDOS.
NA MAO UM
CIGARRO, E EM CIMA DA MESA, GASTA E DESCOLORIDA,
UMA BAZUKA LAURENTINA QUASE VAZIA E UM
COPO.
LI EM TEU OLHAR
UMA AUSÊNCIA FUNDA, CHEIA DE DESTROÇOS,
A DOR ESCRITA NA RIGIDEZ DE TEU CORPO
E NA FRIEZA COM
QUE SEGURAVAS O CIGARRO.
FUI BUSCAR UMA
BAZUCA E SENTEI-ME A TEU LADO, SEM NADA DIZER,
OLHANDO O CAMPO
DE FUTEBOL ALI EM FRENTE
E A NOITE QUE
CAIA INDIFERENTE COMO TODAS AS NOITES.
TU, MEU AMIGO,
TRESANDAVAS A PALAVRAS AZEDAS,
ATROZ MENTE AMARGAS,
DESSAS QUE NOS
ENVENENAM A ALMA E CORROMPEM A FÉ.
MAS SUAVEMENTE,
COMO O ESCORREGAR DA CERVEJA EM NÓS,
AS PALAVRAS, GOTA A GOTA, COMEÇARAM A
ESCORRER...
FALASTE
PALAVRAS DE TODAS AS CORES E ORIGENS.
FALASTE RAIVAS, DECEPÇÕES, MAGOAS, DESESPERANÇAS,
FALASTE O PAI
QUE NUNCA TIVESTE, A MÃE QUE TINHAS MAS QUE NÃO TINHAS,
A NAMORADA QUE
AMAVAS, OS FILHOS QUE QUERIAS TER,
O AMANHA TAO
CHEIO DE NEVOEIROS...
E EU OUVI, OUVI
TUDO O QUE TE APETECEU DESFIAR
NAQUELA NOITE
NA CANTINA DO CHALETA ONDE OS TURRAS
SE IAM
ABASTECER, E ONDE OS PRETOS TROCAVAM FEIJÃO
POR CACHAÇA...
E FALAMOS. E RIMOS FRASES QUE O LUAR ESCUTOU.
JÁ À ENTRADA DO
QUARTEL O SENTINELA PERGUNTOU DO ESCURO:
- QUAL É A SENHA?
TU RESPONDESTE:
- 6 BAZUKAS E 2
CHOURIÇOS ASSADOS!
E RISTE. EU RI TAMBÉM.
E RISTE SEM PARAR. RISTE TODOS OS CANSAÇOS E RAIVAS
A
CONTAMINAREM-TE O CORPO E O SANGUE
ACORDANDO TEU
RISO ATE O CAPIM E A CORUJA.
RISTE A EMOÇÃO TAO LINDA DE QUEM VOLTA A SER FELIZ!
DEPOIS, JÁ DENTRO DO QUARTEL, VINDO DA EMOÇÃO,
DESTE-ME UM ABRAÇO.
COM FORÇA. COMO SÓ QUEM PRECISA O FAZ!
E, SEM NADA
DIZER, NO SILENCIO MAIS ELOQUENTE QUE EU CONHEÇO,
TUA CABEÇA
POUSOU NO MEU OMBRO, E LA FICOU. SEM TEMPO.
O TEMPO QUE
QUIS. PORQUE O TEMPO NÃO EXISTE QUANDO A ALMA VOA!
E QUANDO FINALMENTE
TE AFASTASTE
REPAREI QUE TEU
CORPO PARECIA DANÇAR
MARREBENTAS EM
PASSOS ÁGEIS, OMBROS LEVES
GESTOS
FRESCOS...
A LUA OLHOU
PARA MIM E SORRIU.
E SÓ ENTÃO REPAREI QUE A CAMISA DO MEU CAMUFLADO
ESTAVA MOLHADA
NO OMBRO...
ALFREDO MAIOTO
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