OS NOVOS TURRAS.
Chegam engalanados no
mais vistoso fato Dior e nos pés o mais requintado modelo Gucci. No rosto, beatificamente
seráfico, e com uma vasta camada de botox para encobrir ainda mais o farisaísmo
da pose, exibem o sorriso mais teatral possível milhares de vezes ensaiado
diante do espelho e maquilhado pelo seu gestor de imagem. Os gestos são
comedidos e estudados ao pormenor, as frases decoradas com persistência e
tempo. São os novos turras!
Mas os novos turras em
nada se comparam com os da minha guerra, quando, G3 na mão, coberto de poeira e
dormindo no chão frio, coberto o corpo apenas por um poncho frio, enfrentei
emboscadas e estremeci ao rebentamento das minas. Não!
Estes novos turras,
cultos, modernos, artistas nascidos para a ribalta, olhos macios de mocho,
chegam ao pormenor de marcar uma conferência para determinada hora, todos os
canais de televisão são convidados a comparecer, e, com a maior das canduras, quais
putos reguilas a mascarem uma chiclete, dizem onde, quando e como vão atacar. Cínicos!
E atacam! Suas armas são mortíferas. E disparam. Uma vez, muitas vezes, quantas
forem necessárias. As vítimas foram previamente selecionadas! Por vezes disparam
tiro a tiro, outras em rajadas curtas mas sempre incisivas. Ferem e matam, e
depois, dissimulando a sua perversão com palavras de comediantes predestinados,
afastam-se sem respostas mantendo sempre aquele ar de meninos traquinas
brincando jogos de guerra…
Preferencialmente as
balas são dirigidas para quem não pode ter arma alguma em suas mãos, os
indefesos, aqueles que protestam mas depressa ficam roucos com tanta
indignação. E aqueles que dispõem de armas também poderosas, mantêm-se
incólumes sem a mais ínfima chamuscadela… Com esses os novos turras não querem
nada! Só os outros, aqueles que não têm poder, exceto a palavra e o protesto,
para a aquisição de armas para poder combate-los…
Quando emboscam os
novos turras, sempre de fato e gravata, óculos de sol, resplandecentes, unhas
bem cuidadas e envernizadas, possuidores de armas modernas e super-potentes,
nunca voltam à base sem deixar estendidos no chão alguns feridos. São de uma
eficácia sensacional!
Curiosamente estes
novos turras, fruto das modernidades e do progresso também, já não se limitam a
emboscar em terra. Não! Recentemente adquiriram submarinos comprados a amigos
de amigos para que os seus ataques sejam mais eficazes! A sua guerra adquire
dimensão internacional com escritório em Bruxelas. Depois, num pormenor de
superioridade e de classe, todos eles operam sempre com luvas, requintadas,
ajustadas ao seu currículo, umas luvas grossas e bem quentes que os vão
proteger das frieiras do Inverno…
Porque a guerra
subversiva assim o exige, e apenas por obrigação, eles andam de terra em terra
em ação psicológica distribuindo beijos de conveniência e abraços
dissimuladamente amistosos, bem encharcados no melhor perfume. Precisam de
alvos, e sem alvos sua existência não teria sentido.
No meu tempo os turras
envergavam um camuflado sujo e gasto, e vagueavam pelo mato a pé e calçando botas
semi-gastas ou até rotas. Hoje não. Fruto dos tempos, estes novos turras
movimentam-se pelo país em carros de altíssima cilindrada e com motorista
particular. O carro custou vários milhares de euros, facto sem relevância,
porque afinal o dinheiro não lhes saiu do bolso. E, chegados ao destino, acenam
com aquele toque tao peculiar neles. E, no bolso da camisa, sempre à mão, discretamente
escondido, o cartão de crédito que lhes confere livre trânsito para todos os
gastos pessoais e familiares… Comem, bebem, vestem-se, têm um carro que é deles
embora pertencendo aos outros, não pagam renda, nem água, nem luz, que mais
precisam eles? Assim o salário é imaculadamente forradinho. Mas depois, nas
televisões, bradam bem alto da necessidade de reduzir os custos – mas eles, os
eleitos, os Iluminados, continuam a gastar a regabofes sem controle algum.
Apenas como proteção
de todo seu arsenal de guerra, mandaram construir um “Banker” onde guardam seus
bens pessoais, de seus familiares e até de amigos mais chegados. Assim têm a
certeza que, quando se reformarem aos 50 anos, justamente no apogeu de sua enorme
sabedoria, já têm um local onde se refugiar e gozar o seu quinhão… Falam muito,
adoram falar e serem vistos em todos os canais de televisão a todos os segundos.
Garbosos, altivos, simplesmente únicos!
Como são dotados de
elevadíssima eloquência falam muito mas sempre ( oh! candura das canduras! ) sempre
com o mais angelical sorriso espraiado nos lábios. Sublimes!
Até os
sub-comandantes, rapazinhos gerados na última fornada da Universidade, o canudo
ainda fumegante, gostam de exibir-se como os mestres fazem, soltando bacoradas
a rodos. A escola é a mesma. Afinal, todos descarregados do mesmo ventre!
Não confio, nunca confiei,
em pessoas de sorrisos angelicalmente maquiavélicos. Como os deles. Preferia os
turras do meu tempo, que nunca vi, é certo, mas pelo menos tinha a certeza que,
quando disparavam, da sua arma não saiam sorrisos amarelecidos e demoníacos…O tiro
deles não era tão traiçoeiro!
Francamente, eu detesto estes novos turras!
Alfredo Maioto
Porto, 29/10/2014
4 comentários:
Ai, Ai, alguém não vai gostar de ler isto, mas eu adorei.
João P.M.
Possivelmente estas palavras causarão náuseas a certas pessoas mas paciência temos pena. Quem não quer ser lobo não lhe veste a pele. Tenho quase a certeza que todos os veteranos irão adorar, embora eu felizmente não seja desse tempo.
Rui Paulo Soares
Pois é amigo, a história repete-se, as achegas também, mas como dar a volta ao sistema? O Eça, o Pessoa e centenas de outros, cada um ao seu estilo denunciavam os seus turras e acabaram por criar um ser providencial que nos silenciou durante 38 anos. Jamais quero ir por aí. Hoje a minha G3 é o meu voto de alerta contra este sistema de turras e arregimentados.
Bravo, ao menos que haja alguém com coragem de dizer verdades, num povo de brandos costumes Sadomasoquismo, que leva porrada que se farta mas cai sempre na mesma burrice.
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